Capítulo-8 - A Consulta: No Divã da Loucura


Capítulo 8


Rio de Janeiro, 1974,
Bombas e morteiros para todos os lados.
O Brasil em estado de sítio.

  Qualquer grupo de pessoas na rua, por menor que fosse, era altamente reprimido pelos milicos, acunha dada aos militares da época. Mas para tudo havia uma estratégia. Os livros com conteúdos Marxistas, considerada literatura demoníaca, já que os comunistas caminham em caldeirões ferventes as criançinhas,  tinham que ser  altamente escondidos. Geralmente eram enterrados no fundo de casa, ou em alcovas secretas pela cidade. Os próprios encontros  entre pessoas de um grupo comunista com outro tinham que ser extremamente arquitetados.
            Era noite de uma lua cheia quando o Professor, naquela época,  ainda candidato de psiquiatria  e interno do sexto ano de medicina, estava suando embaixo do cachecol. Um cachecol vermelho enrolado ao redor  do pescoço , embaixo de uma luz  de poste em plena  Praia do Flamengo- este era o sinal.  Era tudo o que ele precisava saber para que alguém do outro grupo  para-militar comunista entrasse  em contato com ele. Saber nomes era  perigoso demais. Trinta  minutos era o tempo Maximo para a espera. Trinta. A brisa do mar soprava forte. As ondas mergulhavam calmamente na areia. Noite bonita. Mas naquele momento  não haveria tempo para contemplações.
O Professor olhou o relógio. Já se tinha passado vinte e oito minutos. Merda. Merda. Queria ir embora. Já havia se arrependido.  Se em trinta minutos ninguém aparecesse a regra era:  desapareça. O plano foi descoberto. Não Tenho dúvidas. Vinte e nove minutos. Merda. Merda.  Agora a  sensação de arrependimento já era maior que o desejo de  que alguém surgisse. Iria fugir para Belo Horizonte. Tinha uns parentes lá, ficaria lá por alguns meses, até  a poeira baixar. Tinha um pai promotor. Isto com certeza o ajudaria.  Mas o meu colega?. Uma preocupação súbita  lhe surgiu.  Como interno de medicina  não poderia abandonar o plantão. Então teve que deixar um colega no seu lugar.  Idiota. Idiota.  Certamente  os milicos apareceriam lá,  perguntariam:

-  Cadê o comuna? .Cacetetes e armas empunhadas  
- Que comuna?  . Diria alguém de  jaleco branco.
-Quem tá de plantão aqui? Já sabemos de tudo.  

O colega ingenuamente  tentaria se explicar,  levaria duas bordoadas na cara, mãos para trás com  pulseira de aço e  empurrão para dentro do camburão.  Se tivesse sorte apanharia só um pouco,  um nariz quebrado, alguns hematomas pelo corpo, só para não perder o costume.  Como não sabia de nada mesmo, depois de uns três dias de tortura física e psicológica, estaria livre. Se tivesse sorte. Idiota. Idiota.  Trinta minutos. Dane-se. Em segundos, ninguém mais se encontrava junto ao poste. Apenas um cachecol vermelho abandonado ao chão. 
A lua brilhava solitária e grandiosa no céu. O professor já estava longe da praia,  nem  viu  quando uma viatura dos  milicos parou junto ao poste e pegou  um cachecol. Na ponta do cachecol  vermelho as iniciais do nome e sobre nome do professor em azul.  Merda. Merda. 

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